A VIDA FAMILIAR DE AGOSTINHO E SUA MÃE MÔNICA
1.
Família e parentes
A família de Agostinho residia em Tagaste,
uma pequena cidade da Numídia, no norte da Àfrica (atualmente, chama-se
Souk-Ahras, na parte oriental da Argélia).
Os especialistas estão de acordo que os
antecedentes raciais de Agostinho eram, provavelmente uma mistura das raças
predominantes no norte da África: bárbara, fenícia e latina.
A família de seu pai, Patrício, possuía,
provavelmente, desde o ano de 212 a.C a condição de cidadão. Anteriormente, os
familiares, provavelmente, tinham sido libertados da gens Aurelia.
O nome Monica (Mônica), a mãe de
Agostinho, indica que era de origem bárbara. A família gozava de um bom nível
social – eram honestiores, não humiliores
(Possídio, vitaAugustini 1).
Embora suas origens genéticas fossem
norte-africanas, a cultura de sua família vinha sendo romana fazia muito tempo
e sua língua materna foi, provavelmente, o latim.
Os especialistas tradicionais
aceitavam a declaração do próprio Agostinho de que ele era um homem pobre, oriundo
de uma família pobre (Serm. 356.13; epist.126.7-8), porém o
significado do termo “pobreza” é relativo, e a família de Agostinho era contada
entre os membros mais ricos de sua cidade rural.
Patrício era curialisou
magistrado de Tagaste e sua situação financeira foi um critério primordial para
poder ser eleito magistrado. Além de possuir terras, a família de Patrício
possuía escravas especializadas em fazer aleitamentos de crianças
(conf. 1.6.7).
Agostinho afirmava que sua
participação nos bens familiares tinha sido igual à vigésima parte dos bens que
ele administrava como bispo de Hipona (epist. 126.7).
A Igreja de Tagaste contava com
boa quantidade de terras, obtidas mediante legados e donativos e, uma vigésima
parte dessa classe de bens podia significar riqueza para uma família de classe
média numa cidade pequena.
Entretanto, o ofício de
conselheiro municipal podia implicar grandes dispêndios de recursos familiares,
visto que se esperava que os magistrados fossem benfeitores de sua comunidade
local, e tinham que cobrir quaisquer faltas nos grandes impostos exigidos pelo
governo imperial.
Portanto, embora a família
vivesse com relativo bem-estar em seu próprio ambiente, figurando entre as
famílias mais destacadas de sua comunidade, deviam ocupar níveis baixos entre a
classe geral dos magistrados.
Patrício
era cliens (ou “protegido”) de um rico proprietário de terras da
região, chamado Romaniano. Este, mais tarde, foi o benfeitor do brilhante filho
de seu protegido.
A disposição de Patrício para
investir, além de suas possibilidades, na educação de seu filho indica sua
ambição para que toda sua família progredisse.
As referências de Agostinho
para com seus pais na comunidade doméstica dizem respeito aos avós que viviam
com ele (Conf. 1.6.8; 1.7.11;1.8-13;1.9.15); ele nunca chegou a ver um dos
avós (mus. 6.11.32). Patrício chegou a ser pater familias,enquanto sua mãe
seguiu sendo matrona da domus (conf. 9.9.20).
Mônica, provavelmente era ainda
muito jovem por aquele tempo então, visto que Agostinho indica que ela se casou
quando alcançou a idade apta para contrair matrimônio (conf. 9.9.19).
Supõe-se que Patrício era mais velho que Mônica, como era costume nos
casamentos de então.
A família de Patrício era pagã;
a de Mônica, cristã (Conf. 1.11.17). Todos seus irmãos e irmãs que
conhecemos, eram também cristãos, como o eram também seus sobrinhos e
sobrinhas.
O próprio Patrício chegou a ser
catecúmeno cristão, quando Agostinho tinha dezesseis anos de idade
(conf. 2.3.6) e foi batizado durante sua última enfermidade no ano de
372 (Conf. 3.4.7;9.9.22).
Quando Agostinho nasceu, Mônica
tinha vinte e três anos, mas ele nunca informou sobre o número ou as idades de
seus irmãos e irmãs. Por isso, não podemos declarar com certeza quantos filhos
teve Mônica e em que ordem (Conf. 9.9.22).
Agostinho tinha um irmão
conhecido, Navígio, e alguns comentaristas supõem que era o mais velho dos
dois. Navígio teve filhas que chegaram a ser mulheres consagradas e residiam,
segundo parece, em Hipona (Possídio, v.Aug. 26).
Agostinho nunca se casou
legalmente, mas a que foi de fato sua mulher, lhe deu um filho, Adeodato. Era
uma criança inteligente, o encanto de seu pai.
Depois da separação de seus
pais, Adeodato ficou com seu pai e foi batizado juntamente com ele em Milão no
ano de 387. Adeodato ia seguindo as pegadas intelectuais de seu pai, porém,
morreu um ano depois que ele e seu pai regressaram de Tagaste no ano 389.
Contava dezesseis anos de idade (Conf. 9.6.14).
Agostinho manteve estreitos
laços com seus parentes homens durante toda sua vida. Seu irmão Navígio esteve
com ele na Itália; com ele estiveram também seus primos Lastidiano e Rústico
(b. vita 1.6). Isto não nos surpreende, visto que a elevação de Agostinho
à fama e à fortuna o tinha colocado em condição de chegar a ser, ao mesmo
tempo, um benfeitor para seus próprios parentes e achegados.
Quando Agostinho
tornou-se bispo em 395-396, dotou à Igreja de Tagaste com toda a parte que
lhe correspondia de seu patrimônio familiar.
Depois da sua consagração,
distanciou-se de suas sobrinhas, por temor de suscitar escândalo na comunidade
monástica (Possídio, v. Aug. 26), mas manteve laços mais estreitos
com seus sobrinhos.
Um deles, chamado também
Patrício, ingressou na comunidade monástica de Agostinho; outro foi sub-diácono
do bispo de Milevus. (Serm. 356.3).
2.
Sua mãe, Mônica
Agostinho fala frequentemente de sua mãe
como mater mea, mater nostra, e numa ocasião a menciona por seu nome
(Conf. 9-13.37).
Mônica, nascida no seio de uma família
católica de Tagaste, “numa família crente que era um ramo sadio de tua Igreja”
(Conf. 9.8.17); cf. ep.93.17); foi criada por uma velha empregada da
casa e foi “educada num ambiente de pureza e temperança” (Conf. 9.9.19),
na qual a empregada cuidava também do pai e dos irmãos de Agostinho.
Numa ocasião, Mônica bebia vinho furtivamente
até que foi acusada por uma empregada de ser uma beberrona, momento na qual ela
corrigiu este vício (9.8.19).
“Chegando à plenitude da idade núbil, foi lhe
dado um marido (Patrício, um pagão) ao qual serviu como a seu senhor”
(Conf. 9.9.19). O marido era um modesto proprietário de Tagaste
(Possídio, Vita Aug. 1.1; Serm. 356,13), autoritário e de
forte temperamento, porém generoso. “Senhor, a fizeste formosa aos olhos de seu
marido e uma pessoa muito amada, respeitada e admirada” (Conf. 9.9.19).
Patrício gastava mais do que podia na
educação de seu filho (2.3.5). Mônica vivia servindo devotamente o seu marido,
suportando amavelmente suas infidelidades conjugais. Com a mesma paciência
amável conquistou a sogra, que inicialmente era contra ela por causa das
fofocas de outras mulheres, porém, logo chegou a apreciá-la muito (9.9.20).
Quando vivia em Tagaste, evitou as piadas e
as insinuações contra outras pessoas e tão somente prestava atenção ao que
pudesse originar reconciliação (9.9.21); embora fosse capaz também de ter
refinadas ironias (9.9.19).
Agostinho nasceu, quando ela tinha 23 anos de
idade (354), e foi talvez seu primeiro filho. Mônica deu a luz também a Navígio
(b.vita12) e a uma filha. A irmã de Agostinho, cujo nome não conhecemos, casou
e depois ficou viúva; depois entrou num mosteiro, chegando a ser superiora de
um mosteiro para mulheres (ep. 211.4; Possídio, v. Aug.26.1). Navígio
também se casou e teve filhos (Possídio, v. Aug. 26.1).
Mônica era dedicada à educação cristã de seus
filhos (Conf. 9.9.22; 1.11.17). Iniciou Agostinho no catecumenato (“Fui
marcado com o sinal da cruz e com o sal na boca”), mas não foi batizado
(1.11.17-18; c. Acad. 6.16.26). Agostinho reteve os ensinamentos cristãos
que tinha aprendido de sua mãe (Conf. 5.14.25; 6,5.8; 6.16.26).
Patrício gostou quando percebeu que Agostinho
tinha chegado à maturidade sexual, porém, Mônica exortou seu filho a evitar as
relações com mulheres casadas (Conf. 2.3.6-7).
Entretanto, não conseguiu acertar um
casamento para ele, por temor de que, impedido pelos laços matrimoniais, se
desviasse as esperanças que ele tinha para conseguir êxitos acadêmicos (2.3.8).
Patrício, que já então era cristão (9.9.22),
morreu nos anos 371-372, e Mônica, com a ajuda de Romaniano, conseguiu que
continuasse os estudos de Agostinho em Cartago (3.4.7; c.
Acad. 2.2.3).
Quando Agostinho se fez maniqueu e colocou em
perigo outros crentes (Conf. 3,11,15; duab. an. 9.11), Mônica o
expulsou de casa, embora depois de um sonho sobre a final conversão dele e
confortada pelas palavras de um bispo (Conf. 3.12.21), cedeu em viver com
ele e “partilhar minha mesa, vivendo sob o mesmo teto”, apesar de que, por
aversão aos erros de seu filho, ela tinha inicialmente relutante a fazê-la
assim (Conf. 3.11.19).
Mônica demonstrou que era uma mulher de fé
(9.13.36), de coragem e de fidelidade (6.1.1), de piedade e de oração (1.11.17;
3.4.8; 6.2.2).
Acusou seu filho de engano e crueldade
(5.8.15) por ter fugido para Roma no ano de 383, deixando-a numa capelinha
dedicada a São Cipriano e situada no porto de Cartago.
Mas Mônica “seguiu por terra e por mar para
estar com ele” (cura mort. 13.16) e reuniu-se com ele em Milão no ano de
385 (Conf. 6.1.1). Ali participou na defesa das Igrejas contra os arianos
e na defesa de Ambrósio e, para obedecer a Ambrósio, abandonou as práticas
religiosas africanas que até então se dedicava (epp. 36.14.32;
54.2.3; Conf. 6.2.2). Chegou assim a ter em grande estima a Ambrósio
(6.2.2).
Mônica retirou-se a Cassicíaco com seu filho
e com os amigos deste durante o inverno de 386/387 e participou nos diálogos:
“O poder da mente dela regressou a mim e, me dei conta de que aquilo era o mais
adequado e o genuíno filosofar. Decidi, portanto, que quando ela tivesse
tempo, participasse em nossas conversações” (Ord. 2.1.1).
“Minha mãe não nos deixava: com sua maneira
feminina de ser, sua fé varonil, a paz de sua idade alcançada, seu amor materno
e toda sua devoção cristã” (Conf. 9.4.8).
Depois do batismo de Agostinho, mãe e filho
decidiram regressar à África, porém, quando os dois estavam aguardando para
embarcar em Óstia, ela teve uma visão (9.1023-25); com a idade de 56 caiu
enferma e morreu (9.8.17; 9.11.27-28).
Embora já estivesse preparada uma tumba em
Tagaste junto a seu marido (9.11.28), ela pediu que fosse enterrada na Itália.
Fonte: DICCIONARIO DE SAN AGUSTIN. SAN AGUSTÍN A TRAVÉS DEL
TIEMPO. Dir.: Allan FITZGERALD, O.S.A. Burgos(ES): Monte Carmelo, 2001, p.
556-558; 911-912.
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