XIII-
DE UM PAI-AVÔ PARA COM A FILHA-NETA
Lindolivo
Soares Moura(*)(**)
Olá,
tudo bem? Imaginei que esta "Dica-reflexão" enviada para minha
neta-filha adolescente talvez possa ser útil para você e/ou alguém que você
ama.
Oi
minha neta-filha querida, tudo bem com você? Curtindo as férias e as coisas
boas que vêm junto com elas? Aproveitar e curtir é muito bom, bom demais, mas
mesmo nesse período de descanso e relax não se pode "baixar a
guarda", pois muitas vezes é justamente aí que o perigo se esconde.
Brincar, curtir e se divertir também exigem cuidado e segurança, mas como para
os mais jovens essas coisas parecem difíceis de conviver juntas, o cuidado e a
segurança é que quase sempre acabam sendo sacrificados. Assim, quando as aulas
reiniciam muita gente acaba retornando com braços e pernas engessados, chinelos
nos pés por não poder calçar sapatos, cabeça enfaixada ou dedão quebrado, e
seguem por aí os infortúnios dos mais afoitos e acelerados. O princípio é
simples: quanto mais energia é liberada, mais atenção e cuidado são
necessários. Férias não é tempo nem ocasião de "liberar geral", como
querem e reivindicam os mais ousados e incautos. Aliás, direta ou indiretamente
a "dica" de hoje fala um pouco sobre isso, mesmo tratando de um
assunto um tanto mais complexo. Já leu ou ouviu falar algo sobre o estilo ou
modelo "fitness" de vida? Se não, com certeza muito em breve ele lhe
será apresentado. Leia e reflita com calma, sem correria, sobre alguns riscos e
perigos que podem se ocultar por trás dessa espécie de fetiche idolatrado.
Depois procure colocar em prática o que lhe parecer razoável e mais compatível
com sua própria filosofia de vida. Vou resumir assim o nosso tema de hoje: O
MODELO OU IDEAL "FITNESS": O QUE PODE HAVER DE ERRADO COM ESSE ESTILO
DE VIDA?
"Change
your style: be 'fitness'!" - "Mude seu estilo: seja 'fitness'!":
e então, minha linda, você aceitaria sem pensar um convite como esse? Se
respondeu "sim", sinto muito; não deveria. Ao menos sem ter antes
procurado verificar quem está por trás desse convite: se uma empresa, um
hospital, uma indústria de alimentos, uma academia, um "personal
trainer" ou uma outra pessoa ou instituição qualquer. Todos podem estar
fazendo uso desse mesmíssimo termo, "fitness" - ou sua fórmula
abreviada, "fit" - motivados e impulsionados por ambições e
interesses bem diferentes. No Brasil, por exemplo, o Ministério da Saúde sequer
adotou ainda esse termo - e tampouco sabemos se pretende fazê-lo - e já existe
toda uma linha de produtos com selo "fit" disponibilizada no mercado
pela indústria alimentícia, com a garantia de serem saudáveis e com a promessa
de oferecerem uma variedade de ganhos e benefícios estéticos imperdíveis. Se
cumprem ou não com o que garantem, e sobretudo com o que prometem, essa já é
uma história bem diferente, mas que para efeito de consumo e de consumismo
pouca ou nenhuma diferença faz. O fato de que tanto o setor da saúde quanto o
"modelo 'fit' ou 'fitness'" tenham o corpo como seu principal foco de
atenção e cuidado, acaba muitas vezes confundindo a cabeça de muita gente. Sem
maiores informações e questionamentos, conclui-se muito rapidamente que aquilo
que contribui para aumentar o "padrão 'fitness'" - da beleza, da
forma e da flexibilidade do corpo - contribui também, automaticamente, para a
melhoria da saúde, o que nem sempre é verdade. Em um bom número de casos,
inclusive, pode acontecer exatamente o contrário: a busca pela manutenção e
melhoria do "ideal 'fitness' de perfeição" pode acabar comprometendo
severamente a saúde tanto física quanto mental da pessoa. Com certa frequência
a mídia tem mostrado pessoas que, em nome desse ideal de perfeição - cujo
padrão de excelência ninguém sabe dizer exatamente qual seja, sobretudo nesses
tempos de liquidez e incerteza - não hesitam em colocar em risco sua saúde, e
se preciso for a própria vida. O "ideal de perfeição" acaba sendo
hoje, para muitos, o que as águas foram um dia para Narciso. Foi-se o tempo em que o famoso bordão do
personagem Paulo Cintura da "Escolinha do Professor Raimundo" -
"saúde é o que interessa, o resto não tem pressa!" - gozava de
consenso e unanimidade. "Ser 'fitness' é o que interessa!": com
certeza seria esse, hoje, o novo bordão do Cintura, caso a Escolinha ainda
existisse.
Como
os riscos e perigos que o perfeccionismo "fitness" para com o corpo
costumam passar desapercebidos - semelhantemente àquelas letrinhas minúsculas e
transparentes dos anúncios, que só se pode enxergar e ler tendo à mão uma boa
lupa - abordarei a seguir aqueles que considero mais importantes, para com os
quais sugiro especial cuidado e atenção de sua parte. Vamos lá, então? Perigo
número um: atribuir excessiva importância ao corpo e à aparência física como se
o amor-próprio e a autoestima dependessem "só", ou
"principalmente", desse único aspecto. Quando isso acontece outros
traços de nossa personalidade e outras dimensões importantes de nossa vida
acabam sendo ignorados, podendo tornar-se depois de certo tempo severamente
prejudicados. Imagine, por exemplo, se essa pessoa vier a ser acometida por uma
doença crônica inesperada, um acidente grave, um aumento considerável de peso,
ou pela simples chegada da velhice. Todas essas situações são potencial e
reconhecidamente capazes de afetar, e muito, tanto a saúde como a forma e a
beleza do nosso corpo. Nesse caso o tiro acabará literalmente "saindo pela
culatra", como diz o velho ditado:
os níveis do autoconceito e da autoestima despencam, a dor emocional acaba se
tornando insuportável, prejudicando principalmente quem menos para isso se
encontra preparado. A melhor forma de compensar essa perda é sem dúvida poder
contar com a segurança proporcionada pelo investimento equilibrado nas diversas
e diferentes áreas de nossa vida, dentre as quais, claro, estão a saúde para
com o corpo e o cuidado para com a forma física. Fora isso, só mesmo recorrendo
à terapia, para o resto da vida e apenas como "paliativo", diga-se de
passagem; nada de esperar contar com milagres. Perigo número dois: deixar-se
atrair e permanecer preso/a nas malhas da "pressão estética". Todo
tipo de perfeccionismo acaba inevitavelmente, mais cedo ou mais tarde, se
transformando em cobrança e pressão; no presente caso, cobrança e pressão
"estética", isto é, relacionada à forma, à beleza e à aparência
física. Ao ser confrontada com as imperfeições e limitações impostas pelo
"princípio de realidade" - a vida tal como ela é, e não como
gostaríamos que ela fosse - a obsessão desenfreada pelo corpo perfeito acaba
produzindo danos e prejuízos mentais e emocionais difíceis de serem reparados;
isso porque raramente a pessoa se sente satisfeita com o nível atingido,
independente de qual nível seja este. Sentimentos de frustração,
auto-rejeição, vergonha e inadequação,
seguidos de distanciamento da família e de isolamento social costumam ocorrer
com frequência, fazendo com que os níveis de estresse, ansiedade e até de
depressão subam rapidamente. Remédios não conseguem obviamente atingir a raíz
do problema, o que só se mostra possível quando se consegue escapar da pressão
propriamente dita, a essa altura uma tarefa nada fácil. Se sair é difícil,
melhor então é fazer de tudo para não entrar, o que se pode conseguir
investindo na prevenção. E se para com a bebida isso significa "evitar o
primeiro gole", como ensinam os "alcoólicos anônimos", para com
a pressão estética significa conhecimento e consciência prévia de todas as
exigências, danos e prejuízos que ela traz consigo. Melhor, portanto, minha
linda, investir o quanto mais cedo possível na prevenção. Perigo número três: a tentação de acelerar o tempo e o processo na
busca pela aquisição da forma bem definida e do corpo perfeito. De acordo com
uma ortopedista do Hospital do Coração de São Paulo - capital, "a obsessão
por um corpo saudável e perfeito a qualquer custo, sem orientação profissional,
e num reduzido espaço de tempo, pode prejudicar e muito a saúde da
pessoa". Um dos clássicos exemplos dessa autêntica "disritmia" é
o chamado "overtraining", caracterizado por um excesso de exercícios
praticados num reduzido espaço de tempo, insuficiente para que o corpo possa se
recuperar e recobrar as energias. Esse autêntico "descompasso" acaba
afetando severamente a autoestima e a qualidade de vida, na medida em que traz
consigo consequências do tipo: elevação da frequência cardíaca quando a pessoa
se encontra em repouso, alteração e até perda do condicionamento físico,
comprometimento da qualidade do sono, alteração do humor caracterizada
sobretudo pelo aumento da intranquilidade e da irritabilidade; tudo isso, além
de acarretar dor, cansaço e fadiga em excesso. Esse quadro pode, segundo os
especialistas, variar de leve, moderado, a severo, dependendo de cada pessoa e
de cada situação em particular, em certos casos exigindo tratamento e
acompanhamento especializados. Um notório exemplo, portanto, minha linda, de
que nem sempre o estilo ou ideal "fitness" do corpo malhado e
"sarado" casa bem com saúde e qualidade de vida.
Perigo
número quatro: seleção e ingestão inadequada e desbalanceada de alimentos e
nutrientes. O perigo apontado anteriormente falava do "excesso" de
exercícios. Uma dieta ou uma alimentação, por sua vez, podem pecar tanto pelo
excesso como pela falta; nesse caso, de alimentos e nutrientes necessários e essenciais à saúde. Aliás é
bastante comum que uma coisa puxe a outra: pessoas que acabam exagerando no
consumo de determinados alimentos e nutrientes considerados os
"mocinhos" da "dieta 'fitness'", simplesmente terminam
descartando aqueles que são tidos como os grandes "vilões". Esse erro
pode ser crucial tanto para o favorecimento da aquisição de certas doenças como
também para a o comprometimento da imunidade do organismo. Afirmar que uma
alimentação ou uma dieta precisam ser bem "balanceadas" significa
dizer que elas precisam contemplar "todos os ingredientes"
necessários para a saúde - vitaminas, proteínas e sais minerais, dentre outros
- na "medida certa" e na "quantidade adequada". O consumo
excessivo de determinado nutriente "não compensa" - como se imagina
ou se pretende - a falta de outros descartados e não ingeridos. Come-se mal não
tanto por se comer muito ou se comer pouco - ainda que isso também possa
comprometer o equilíbrio ou o balanceamento final - mas sim por se privilegiar
o gosto do paladar e/ou satisfazer as exigências do ideal "fitness",
em detrimento do que é tido consensualmente como saudável por quem entende do
assunto. Disso se conclui que, em se tratando de saúde, o médico, o
farmacêutico e o nutricionista devem
preceder o "personal trainer", o esteticista e o dermatologista. Quem
quer que podendo ou não economicamente, se decide por inverter essa ordem
devida, deve estar preparado para assumir os riscos e arcar com as
consequências. Perigo número cinco - e último, em razão do espaço,
naturalmente: seguir e "engolir sem digerir" dicas e orientações de influenciadores digitais que pouco ou nada
entendem do assunto. Fenômeno curioso, esse: com a chegada da internet basta
alcançar certo número de seguidores para se adquirir fama, notoriedade, e da
noite para o dia virar celebridade. Alcançadas a popularidade e a fama, como que
por um passe de mágica a pessoa passa a ser considerada "autoridade";
em qualquer tipo de assunto, diga-se de passagem. Como a onda ou movimento
"fitness" parece ter chegado para ficar - por quanto tempo só Deus
sabe, já que os tempos de hoje são líquidos e incertos demais - raro é o
influenciador digital que não tenha suas próprias "dicas e
orientações" sobre o assunto para compartilhar com seu "respeitável
público!!!" e fiéis seguidores. Os novos tempos sugerem que "nunca
tantos, pretenderam saber tanto, mesmo sabendo tão pouco" - parafraseando
o grande estadista inglês Winston Churchill. E quando tantos reivindicam saber
tanto sobre tudo e qualquer coisa, todo cuidado é pouco. Papagaio também fala e
nada sabe. Um bando de maritacas, então, Deus que nos livre! Com saúde, beleza
e forma física não se brinca, minha linda. Por isso procure selecionar com
critério influenciadores revestidos de "autoridade" e não apenas de
popularidade, fama e celebridade, quando buscar algum tipo de ajuda e orientação
sobre aquilo que diga respeito ao seu corpo, sua saúde e sua qualidade de vida.
Muita gente vem se deixando levar por falsas promessas de clubes e academias
"fitness", cirurgias perigosas realizadas por falsos médicos que
nunca freqüentaram uma sala de aula, dietas milagrosas que prometem corpos
simétricos, elegantes e atraentes, alimentos, remédios e vitaminas de eficácia
duvidosa, e por aí seguem os efeitos colaterais nada recomendáveis do
"ideal" e da "ideologia 'fitness'". Seja você a primeira a
cuidar de si mesma, e sempre procure se certificar com antecedência e segurança
sobre tudo que diga respeito ao seu corpo e sua saúde, tanto física quanto
mental e emocional. Depois da vida, "saúde é o que interessa, o resto não
tem pressa!". Beijos nesse coração de ouro. AMO MUITO VOCÊ, A BIA, O BEN, O FRAN E O ALÊ. Quem ama, cuida, e
quem se ama, se cuida ainda mais e melhor.
(*)
Texto enviado via whatsapp, de Vitória(ES) pelo meu amigo e irmão Lindolivo
Soares Moura.Obrigado!
(**)Psicólogo e Professor Universitário no
Consultório de Psicologia- Universidade Federal do Espírito Santo- Vila Velha, Espírito Santo, Brasil.
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