sábado, 15 de fevereiro de 2025

XIII - REFLETINDO COM LINDOLIVO SOARES MOURA- PARTE II(*)

 

XIII - REFLETINDO COM LINDOLIVO SOARES MOURA- PARTE II(*)

 

"NEM SEMPRE DEUS RESPONDE 'SIM' ÀS NOSSAS PRECES! MAS UM 'NÃO', VINDO DE DEUS, PODE SER A SOLUÇÃO: QUANDO A FÉ NÃO REMOVE MONTANHAS, REMOVE A CORDILHEIRA INTEIRA!"

 "Tome muito cuidado com o que você  pede  em  suas  orações,  porque você corre  o  sério  riscode obtê-lo"  [Richard Bach]

Não fique triste, e menos ainda desanimado[a], com o conteúdo para com o qual, a partir de agora, você começa a interagir. Apenas, se for o caso, ressignifique sua crença a respeito do que estará sendo abordado, caso seu "daimon" interior venha a sugerir que o faça. Assustou-se com o termo "daimon"!? Pois não deveria! Saiba que "daimon" é um termo da filosofia e da mitologia gregas, significando uma espécie de entidade espiritual intermediária entre os deuses e os humanos, algo como um "demiurgo", termo com praticamente o mesmo significado. Sócrates, um dos pilares da cultura grega e não apenas da filosofia, dizia possuir um "daimon" dentro de si, uma espécie de voz ou consciência que o orientava ética e moralmente, ajudando-o a evitar o acometimento de erros e maldades de todo tipo, sem porém indicar e menos ainda lhe ordenar especificamente o que fazer em cada caso específico. Platão também possuía seu próprio "daimon", que de acordo com ele estava intimamente ligado à alma e ao destino de cada pessoa. Aristóteles, por sua vez, relacionava tanto  seu "daimon" pessoal como o "daimon" de cada pessoa, à felicidade e à prática da virtude, uma força interior energizante que facilitaria a cada ser humano acessar e atualizar, no sentido aristotélico do termo - potência X ato - seu potencial máximo. Já os estóicos concebiam "daimon" como sendo uma espécie de "centelha divina" presente no interior de cada pessoa, algo semelhante ao conceito de "espírito", "logos", "razão superior ou universal". Algumas filosofias posteriores, a exemplo do Neoplatonismo, concebiam "daimon" como sendo uma espécie de elo de conexão entre o mundo material humano e o mundo espiritual divino.

A partir daí as concepções começam gradual e progressivamente a degringolar bastante, até degringolar de vez. O termo passaria a assumir uma conotação lamentavelmente ambígua, ora sendo associado a guias espirituais favoráveis em nosso percurso de busca pela iluminação ou pelo divino, ora relacionado a entidades claramente maléficas, demoníacas e prejudiciais, que tendem a agir em sentido exatamente contrário. Esse é um exemplo paradigmático - modelar, referencial e exemplar - de como a mente humana é capaz de passar de um extremo ao outro em sua função não só de interpretar, mas também, ideologicamente ou não, forjar, ressignificar e rematrizar termos e conceitos ao longo do tempo. A isso Lou Marinoff atribui o nome de "Princípio do Duplo Poder", que pode ser resumido mais ou menos da seguinte forma: tudo aquilo que traz consigo potencial criativo, renovador e transformador para o bem, traz também consigo, igual e proporcionalmente, potencial prejudicial, pernicioso e destrutivo para o mal. Felizmente entre nós, no ocidente, Carl Jung tratou de reinterpretar o conceito de "daimon" - ou ressignificar, para quem assim achar melhor - concebendo-o como uma manifestação do inconsciente, ou, mais especificamente, uma manifestação do arquétipo do "Self", arquétipo principal e central em que a pessoa alcança a integração e a harmonia entre os opostos internos, e se torna plenamente ela mesma - ou "eu verdadeiro", acordo com outras psicologias. Não se permita complicar ainda não, pois o parágrafo já está chegando ao fim. Ao dar à luz a chamada "psicologia arquetípica", James Hillman, nas pegadas de Jung, descreveu "daimon" como sendo "o chamado do destino que guia cada pessoa em seu propósito único e indelegável ao longo de sua vida". Agora sim, ponto parágrafo.

Mas afinal, que relação tem esse tal "daimon" interior de cada pessoa - obviamente concebido como um espírito bom e do bem, e não o contrário - com a temática da fé e da intervenção divina, que estamos abordando na presente reflexão? Antes de responder sua pergunta, ou já respondendo, primeiro observe o seguinte: quando se diz ou se afirma que a fé, do tamanho de um grão de mostarda que seja, seja capaz de remover até mesmo uma montanha, em hipótese alguma se pretende afirmar que tal poder emana do próprio crente ou fiel que crê, e sim de Deus, Ele sim, absolutamente capaz e potencialmente poderoso para operar o que nós humanos, imperfeitos, finitos e limitados, por nós mesmos não podemos fazê-lo. Se cada cura ou intervenção milagrosa operada por Jesus, por exemplo, é "precedida", e em certo sentido "condicionada", pela fé expressa ou presumida de quem por elas é beneficiado ou "agraciado", o certo é que a potência ou a força capaz de operar tal mudança ou transformação - no caso, equivalente a um milagre - jamais provém do pedinte, do crente ou do intercessor, e sim diretamente do próprio Criador ou de quem com Ele compartilha a mesma natureza, a mesmíssima potência e o mesmíssimo poder. Vejamos um exemplo para que aquilo que está sendo afirmado possa ficar mais claro e mais facilmente assimilado. Quando um exorcista no exercício de "sua função" - entre "aspas", percebeu bem? - ao "ordenar" que seja "banida", "rechaçada" ou "exorcizada" uma entidade maligna de uma determinada pessoa, nunca, jamais ele o faz - é forçoso compreender bem isso - em nome próprio e pessoal, e sim, única e exclusivamente em nome de algum deus reputado como todo poderoso e capaz de operar tal ação. No exemplo citado, pressupõe-se que apenas pessoas altamente probas - na fé, no testemunho, na capacitação espiritual e na santidade de vida - estejam aptas a realizar tal ato de "exorcismo" em nome de um deus, de um "logos" ou de uma "Inteligência Superior". Também aqui se aplicam as palavras de Jesus como Mestre: "tudo que com fé, pedirdes em oração, vós o recebereis". Não é dito, perceba bem, que a própria fé é o agente mesmo da concessão, outorga ou ação, como tampouco o é o próprio pedinte que intercede ou exorciza. O que sim, se presume, é que quanto maior for a fé, maior a probabilidade de que o conteúdo ou objeto da outorga ou da concessão seja concedido por parte daquele que para isso se revista de autonomia, competência, condições, e acima de tudo "vontade" para realizar o pedido solicitado, ou a ação pretendida no caso do exorcismo. Um novo ponto parágrafo pode ajudar a entender melhor a questão.

Apenas por questão hipotética de análise e de reflexão, vamos presumir que a própria mãe de Jesus, Maria, tenha sido a pessoa que mais confiança e fé depositava em seu próprio Filho. O palco e a cena principal são as Bodas de Caná, em que ocorre um momento de extrema enrascada para dois jovens recém casados. O vinho - a bebida clássica e tradicional para a ocasião - de repente havia faltado. Muito provavelmente Jesus já teria percebido e se dado conta do problema antes mesmo que sua própria mãe. No entanto Ele se cala, silencia. Não diz nada! Não intervém ou sugere absolutamente coisa alguma! Pedagogia divina é outra coisa, não é verdade? Lembra-se dos discípulos de Emaús!? Como o mesmo Jesus, agora ressuscitado, de acordo com as Escrituras, simula não saber absolutamente nada do que teria acontecido ou estava acontecendo naquele momento!? Pedagogia pura, por parte de Jesus! Já aqui, em Caná, Ele apenas observa! Observa e aguarda. Aguarda o quê!? Aguarda quem!? Não sabemos! Ele, sim, com certeza sabia. Nós não. Sua mãe intervém! Ele contesta! Dá um "chega pra lá"! A mãe não retruca! A mãe confia! A mãe presume! A mãe aguarda! A mãe media! A mãe retorna novamente à cena! De alguma forma - seria a fé uma espécie de "sexto sentido"? - a mãe sabia! Por isso ordena! Ordena não ao filho! Ordena aos criados! Ordena o quê!? A fazer não o que ela, mas o que Ele, o Filho, mandasse! Os criados obedecem. Agora é Jesus quem ordena! Ninguém sabe! Ninguém desconfia! "i¿Qué pasa!?". O milagre está acontecendo!  Levem ao mestre-sala! Que maravilha! O restante você já sabe. Mas aí vem a pergunta: por que, ao invés de dizer o que disse, Jesus não disse, por exemplo: "façam tudo que ela vos mandar!". Como assim!? Ela, Maria!? Isso mesmo! Por qual razão Jesus não disse: "façam tudo que ela, minha mãe, vos mandar!", ao invés de mandar Ele mesmo!? Eu lhes digo porque não disse: não disse porque a potência, o poder e a força estavam com Ele, e não com ela. Por isso ela, e não ele, disse o que disse: "façam tudo o que Ele vos mandar!". A mãe crê! A mãe acredita! A mãe confia! A mãe media! A mãe intervém! A mãe suplica! Aí você pergunta: "a mãe ou a fé, faz ou fez tudo isso?". Você tem razão! A primeira resposta dada por Jesus deixa claro que o pedido foi aceito em virtude da fé daquela "mulher", e não pelo fato de essa mesma mulher ser sua mãe. O Filho entendeu! O Filho acolheu! O Filho fez exatamente como a mãe - corrijo-me novamente: exatamente como a fé pediu. O milagre aconteceu! Quem operou!? Operou o quê? O milagre!? Se você se refere ao milagre, quem operou foi Ele, Jesus; não ela! Mérito dela ou d'Ele!? Eu respondo: você decide! O mérito da "concessão" foi d'Ele, Jesus, já o da "mediação" foi dela, Maria. Teria Ele operado a intervenção sem o pedido dela? Não sabemos. Jesus, sim, sabia! Maria também sabia!? Também não sabemos. O que sabemos, então!? O que sabemos é que Maria creu! Que Maria acreditou! Que Maria confiou! Que Maria se comoveu! Que Maria mediou! Que Maria intercedeu! E em contrapartida: que Jesus entendeu! Que Jesus acolheu! Que Jesus se sensibilizou! Que Jesus realizou! Que o milagre aconteceu! Que o mestre-sala aprovou! Que o problema se resolveu! Que todo mundo bebeu! Que o casal comemorou! Isso é tudo que sabemos!  Compreende agora, antes que o parágrafo se acabe, por qual razão é dito que a fé é crer ou acreditar naquilo que não se vê, naquilo não se sabe, naquilo do qual não se tem certeza!? Ótimo! Que bom que você entendeu o que em Caná aconteceu! Agora sim, podemos paragrafear.

Obs.: todo mundo feliz, o problema da falta do vinho resolvido, por isso vou deixar a parte dois finalizada por aqui. Com a terceira, espero poder encerrar. Fica bem pra você!? Fechô!? Então tá fechado para mim também. Abraços e tchau tchau. Até a próxima.

( * ) Reflexão enviada de Vitória por whatsapp pelo autor.

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