sábado, 24 de setembro de 2022

REFLEXÃO DOMINICAL II

 

REFLEXÃO DOMINICAL II

A riqueza endurece o homem: avareza

 

O profeta Amós poderia figurar numa antologia de literatura irônica (p.ex., as “vacas de Basã”, Am 4,1). Na semana passada, encontramo-lo revelando a ambiguidade dos ricos comerciantes da Samaria. Hoje, censura-lhes a irresponsabilidade (1ª leitura). Denuncia o luxo e a luxúria das classes dominantes, enquanto o povo é ameaçado pela catástrofe da injustiça social e da invasão assíria. Por isso, esses ricaços sairão ao exílio na frente dos deportados… (Amós evoca ironicamente a gloriosa história antiga: os ricos, porque têm uma cítara para tocar, acham que são cantores como Davi… Samaria é a “casa de José”, mas José distribuía alimento aos de sua casa…)

A insensibilidade pelo sofrimento do pobre é também o tema inicial da parábola do rico e Lázaro, Lc 16,19-31 (evangelho). As sobras da mesa do rico não vão para o pobre, mas para o cachorro. Parece atualidade. Porém, vem a morte, igual para os dois. O quadro se inverte. Lázaro vai ao seio de Abraão, o rico para o inferno. Há entre os dois um abismo intransponível, de modo que Lázaro nem poderia dar-lhe um dedinho de água para aliviar o calor infernal. Este abismo já existia, no fundo, antes da morte, mas com a morte se tomou intransponível. Então, o rico pede que seus irmãos sejam avisados por Lázaro. Mas Abraão responde: “Eles têm Moisés e os profetas. Nem mesmo em alguém voltando dos mortos acreditarão”: alusão a Cristo.

Dureza, isolamento, incredulidade: eis as conseqüências de viver para o dinheiro. Podemos verificar esse diagnóstico em redor de nós, cada dia, e, provavelmente, também em nós mesmos. Porque a pessoa só tem um coração; se ele se afeiçoa ao dinheiro, fecha-se ao irmão.

Os ricos são infelizes porque se rodeiam de bens como de uma fortaleza (cf. os condomínios fechados). São “incomunicáveis”. Vivem defendendo-se a si e a suas riquezas. Os pobres não têm nada a perder. Por isso, “as mãos mais pobres são que mais se abrem para tudo dar”.

Em nosso mundo de competição, a riqueza transforma as pessoas em concorrentes. A riqueza é vista não como “gerência” daquilo que deve servir para todos, mas como conquista e expressão de status. Tal atitude marca a riqueza financeira (capitalização sem distribuição), a riqueza cultural (saber não para servir, mas para sobrepujar) e riqueza afetiva (possessividade, sem verdadeira comunhão). Considera-se a riqueza recebida como posse em vez de “economia” (palavra grega que significa: gerência da casa). Não se imagina o tamanho deste mal numa sociedade que proclamou o lucro e a competição como seus dinamismos fundamentais. Até a afetividade transforma-se em posse. As pessoas não se sentem satisfeitas enquanto não possuem o objeto de seu desejo, e, quando o possuem, não sabem o que fazer com ele, passando a desejar outro… Pois não sabem entrar em comunhão. Assim, a parábola de hoje é um comentário do“ai de vós, ricos” (Lc 6,24).

Merece atenção a 2ª leitura. Pelo estilo, é o “testamento literário” de Paulo. O testemunho de Cristo neste mundo não é nada pacífico. É uma luta: o bom combate. Devemos travá-lo até o fim, para que vivamos para sempre com aquele que possui o fim da História. Poderíamos acrescentar à leitura os versículos que seguem (1Tm 6,17-19): uma lição do que o cristão deve fazer com seus bens.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

Mensagem

A riqueza que endurece

Como no domingo anterior, ouvimos as censuras de Amós contra os ricos da Samaria, endurecidos no seu luxo (1ª leitura). Não se preocupam com o estado lamentável em que se encontra o povo. Jesus, no evangelho, descreve esse tipo de comportamento na inesquecível pintura do ricaço e seus irmãos, que vivem banqueteando-se e desprezando o pobre Lázaro, mendigo sentado à porta. Quando morre e vai ao inferno, o rico vê, de longe, Lázaro no céu, com o pai Abraão e todos os justos. Pede para que Lázaro venha com uma gota d’água aliviar sua sede. Mas é impossível. O rico não pode fazer mais nada, nem sequer consegue que Deus mande Lázaro avisar seus irmãos a respeito de seu erro. Pois, diz Deus, nem mandando alguém dentre os mortos eles não acreditam. Imagine, se mesmo a mensagem de Jesus ressuscitado não encontra ouvido! Mas nós continuamos como o rico e seus irmãos.

Os pobres morrem às nossas portas, onde despejamos montes de comida inutilizada… (Alguma prefeitura talvez organize a distribuição das sobras dos restaurantes para os pobres.) Devemos criar uma nova estrutura da sociedade, de modo que não haja mais necessidade de mendigar, nem supérfluos a despejar. Isso aliviará, ao mesmo tempo, o problema social e o problema ecológico, pois o meio ambiente não precisará mais acolher os nossos supérfluos. Mas, ao contrário, cada dia produzimos mais lixo e mais mendigos.

O exemplo do rico confirma a mensagem de domingo passado: não é possível servir a Deus e ao dinheiro. Quem opta pelo dinheiro, afasta-se de Deus, de seu plano e de seus filhos. Talvez decisivamente.

Em teoria, aceitamos esta lição. Mas ficamos por demais no nível pessoal e interior. Procuramos ter a alma limpa do apego ao dinheiro e, se nem sempre o conseguimos, consideramos isso uma fraqueza que Deus há de perdoar. Mas não fazemos a opção por Deus e pelos pobres em nível estrutural, ou seja, na organização de nossa sociedade, de nosso sistema comercial etc. Temos até raiva de quem quer mudar a ordem de nossa sociedade. Prendemos-nos ao sistema que produz os milhões de lázaros às nossas portas. Pior para nós, que não teremos realizado a justiça, enquanto eles estarão na paz de Deus.

A “lição do pobre Lázaro” só produzirá seu efeito em nós, “cristãos de bem”, se metermos a mão na massa para mudar as estruturas econômicas, políticas e sociais de nossa sociedade.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

https://www.dioceseunivitoria.org.br/2019/09/26o-domingo-do-tempo-comumano-c/

 

 

 

 


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