REFLEXÃO DOMINICAL I
A
CURA DOS LEPROSOS
- A liturgia deste domingo mostra-nos, com
exemplos concretos, como Deus tem um projeto de salvação para oferecer a todos
os seres humanos, sem exceção. Reconhecer o dom de Deus, acolhê-lo com amor e
gratidão, é a condição para vencer a alienação, o sofrimento, o afastamento de
Deus e dos irmãos e chegar à vida plena.
- A primeira
leitura revela que só Deus oferece ao homem a vida e a salvação, sem
limites nem exceções. Ao ser humano resta acolher o dom de Deus, reconhecê-lo
como o único salvador e manifestar-lhe gratidão.
- A leitura descreve a cura do sírio Naamã e
as reações das várias personagens envolvidas; mas, mais do que apresentar uma
reportagem do acontecimento, os autores deuteronomistas quiseram tecer algumas
considerações de caráter teológico e catequético, que ajudassem os israelitas
(seduzidos pelo culto de Baal) a redescobrir os fundamentos da sua fé.
- Naamã não ficou só curado de uma doença
física que punha em risco a sua vida; mas a intervenção de Deus trouxe numa
transformação espiritual que fez do sírio Naamã um homem novo e o levou a
deixar os ídolos para servir o verdadeiro e único Deus. A expressão dessa
mudança radical é a afirmação de Naamã de que "não há outro Deus em toda a
terra senão o de Israel" (v.15) e que nunca mais irá "oferecer
holocausto ou sacrifício a quaisquer outros deuses, mas apenas ao Senhor, Deus
de Israel" (v.17).
- A
história também deixa claro que a oferta da salvação não é um dom exclusivo,
reservado a alguns privilegiados ou a uma raça especial: Naamã é sírio e,
portanto, um inimigo tradicional do Povo de Deus. Mas Deus não faz distinção de
pessoas e oferece a todos, sem exceção, a sua graça. O que é decisivo é o
acolher o dom de Deus e aceitar deixar-se transformar por ele.
- A segunda
leitura define a existência cristã como identificação com Cristo. Quem
acolhe o dom de Deus torna-se discípulo: identifica-se com Cristo, vive no amor
e na entrega aos irmãos e chega à vida nova da ressurreição.
- O Evangelho
apresenta-nos um grupo de leprosos que se encontram com Jesus e que através
dele descobrem a misericórdia e o amor de Deus. Eles representam toda a
humanidade, envolvida pela miséria e pelo sofrimento, sobre quem Deus derrama a
sua bondade, o seu amor, a sua salvação. Também aqui se chama a atenção para a
resposta do homem ao dom de Deus: todos os que experimentam a salvação devem reconhecer
o dom, acolhê-lo e manifestar a Deus a sua gratidão.
- No "caminho" de Jesus e dos
discípulos para Jerusalém aparecem dez leprosos. O leproso é, no tempo de
Jesus, a imagem do marginalizado. Além de causar naturalmente repugnância pela
sua aparência e de infundir medo de contágio, o leproso é um impuro ritual (cf.
Lev 13-14), a quem a teologia oficial atribuía pecados especialmente gravosos
(a lepra era o castigo de Deus para esses pecados); por isso, o leproso não
podia sequer entrar na cidade de Jerusalém, a fim de não tirar a pureza da
cidade santa. Devia afastar-se de qualquer convívio humano para que não
contaminasse os outros com a sua impureza física e religiosa. Em caso de cura,
devia apresentar-se diante de um sacerdote, a fim de que ele comprovasse a cura
e lhe permitisse a reintegração na vida normal (cf. Lev 14). Podia, então,
voltar a participar nas celebrações do culto.
- O
episódio dos dez leprosos (que é exclusivo de Lucas) mostra que Deus tem uma
proposta de vida nova e de libertação para oferecer a todos. O número dez tem,
certamente, um significado simbólico: significa "totalidade" (o
judaísmo considerava necessário que pelo menos dez homens estivessem presentes,
a fim de que a oração comunitária pudesse ter lugar, porque o "dez"
representa a totalidade da comunidade). A presença de um samaritano no grupo
indica, contudo, que essa salvação oferecida por Deus, em Jesus, não se destina
apenas à comunidade do "Povo eleito", mas se destina a todos os
homens e mulheres, sem exceção, mesmo àqueles que o judaísmo oficial
considerava definitivamente afastados da salvação.
- Como lidamos com aqueles que a sociedade de
hoje considera "leprosos" e que, muitas vezes, se encontram numa
situação de exclusão e de marginalidade (os sem abrigo, os drogados, os
deficientes, os doentes terminais, os idosos abandonados em lares, os
analfabetos, os que vivem abaixo da pobreza etc)?
- Curiosamente, os dez "leprosos"
não são curados imediatamente por Jesus, mas a "lepra" desaparece
"no caminho", quando iam mostrar-se aos sacerdotes. Isto sugere que a
ação libertadora de Jesus não é uma ação mágica, caída repentinamente do céu,
mas um processo (o "caminho" define, neste contexto, a caminhada
cristã), no qual o crente vai descobrindo e interiorizando os valores de Jesus,
até à adesão plena às suas propostas e à efetiva transformação do coração.
Assim, a nossa "cura" não é um momento mágico que acontece quando
somos batizados, ou fazemos a primeira comunhão ou somos crismados; mas é uma
caminhada, durante a qual descobrimos Cristo e nascemos para a vida nova.
http://diocesedesaomateus.org.br/wp-content/uploads/2022/08/09_10_22-1.pdf
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